Consciência Negra" retrata a disputa pela
memória histórica.
Preservar
a memória é uma das formas de construir a história. É pela disputa dessa
memória, dessa história, que nos últimos 32 anos se comemora no dia 20 de
novembro, o "Dia Nacional da Consciência Negra".
Nessa
data, em 1695, foi assassinado Zumbi, um dos últimos líderes do
Quilombo dos Palmares, que se transformou em um grande ícone da resistência
negra ao escravismo e da luta pela liberdade. Para o historiador Flávio Gomes,
do Departamento de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a
escolha do 20 de novembro foi muito mais do que uma simples oposição ao 13 de
maio: "os movimentos sociais escolheram essa data para mostrar o quanto o
país está marcado por diferenças e discriminações raciais.
Foi
também uma luta pela visibilidade do problema. Isso não é pouca coisa, pois o
tema do racismo sempre foi negado, dentro e fora
do Brasil. Como se não existisse".
Como surgiu o Dia da Consciência Negra
No dia 20
de novembro de 1695, o negro Zumbi, chefe do Quilombo dos Palmares, foi morto
em uma emboscada na serra Dois Irmãos, em Pernambuco, após liderar uma
resistência que culminou, também, com o início da destruição do Quilombo.
O
Quilombo dos Palmares foi uma comunidade criada pelos escravos que fugiam de
seus senhores para viver em liberdade. Houve uma época em que o Quilombo
abrigou mais de 20 mil pessoas.
Zumbi
nasceu no Quilombo mas, ainda recém-nascido, foi capturado e entregue a um
padre, que lhe deu o nome Francisco, o ensinou a ler e a escrever. Aos 15 anos
de idade, o menino resolveu voltar ao Quilombo, onde, pouco tempo depois,
tornou-se líder. Em 1995, após 300 anos de sua morte, Zumbi foi reconhecido
como herói nacional.
As
rebeliões de escravos foram bastante frequentes no período colonial. Os negros
fugidos escondiam-se na mata e organizavam-se em grupos, para sobreviver à
hostilidade do ambiente e às investidas dos brancos.
Os
grupos, internamente coesos, recebiam o nome de quilombos e as aldeias que os
compunham, de mocambos. O mais conhecido dos quilombos foi de Palmares, pois
foi o que mais tempo durou (1630 -1695), o que ocupou maior área territorial
(cerca de 400 km2 dos atuais estados de Pernambuco e Alagoas) e o que resistiu
mais bravamente aos ataques dos brancos.
Palmares
se organizou como um verdadeiro Estado - com as estruturas dos estados
africanos, onde cada aldeia tinha um chefe, os quais elegiam seu rei - e
possuía um verdadeiro exército, além de fortificações em torno das aldeias, que
deixaram os comandantes brancos admirados.
Tinha uma
produção agrícola bem avançada, que dava para a subsistência das aldeias e
ainda produzia um excedente que podia ser negociado com mascates e lavradores
brancos. No entanto, a própria existência de um Estado independente dentro da
colônia era inaceitável para os portugueses, que consideravam Palmares como seu
maior inimigo, depois dos holandeses.
O
primeiro rei de Palmares foi Gangazumba, que comandou uma bem-sucedida
resistência, repelindo dezenas de expedições dos brancos. Em 1678, assinou uma
trégua com o governador Aires de Souza e Castro - atitude que dividiu o
quilombo.
Em consequência,
Gangazumba terminou por ser envenenado. Foi substituído por Zumbi que já era um
líder respeitado e que se tornou o grande herói dos Palmares. Várias investidas
foram feitas contra o quilombo: duas ainda sob o domínio Falar sobre o Dia da
Consciência Negra nos faz parafrasear Patativa quando ele propõe o respeito às
diferenças. Acreditamos que isto não deve ser encarado como concessão ou exceção
a uma regra socialmente estabelecida, mas como o direito de igualdade em
oportunidades entre os indivíduos.
O dia 20
de novembro marca o assassinato do líder Zumbi dos Palmares, oficializado herói
nacional, por ocasião do tricentenário de sua morte em 1996. Símbolo da
resistência contra o racismo, a opressão e as desigualdades sociais. Marca da
resistência dos povos contra o colonialismo, o imperialismo e o terrorismo em
todo o mundo, sob todas as formas.
Construindo o "Dia da Consciência Negra"
O 20 de
novembro trata da data do assassinato de Zumbi, em 1665, o mais importante
líder dos quilombos de Palmares, que representou a maior e mais importante
comunidade de escravos fugidos nas Américas, com uma população estimada de mais
30 mil.
Em várias
sociedades escravistas nas Américas existiram fugas de escravos e formação de
comunidades como os quilombos. Na Venezuela, foram chamados de cumbes, na
Colômbia de palanques e de marrons nos EUA e Caribe. Palmares durou cerca de
140 anos: as primeiras evidências de Palmares são de 1585 e há informações de
escravos fugidos na Serra da Barriga até 1740, ou seja bem depois do
assassinato de Zumbi. Embora tenham existido tentativas de tratados de paz os
acordos fracassaram e prevaleceu o furor destruidor do poder colonial contra
Palmares.
Há 32
anos, o poeta gaúcho Oliveira Silveira sugeria ao seu grupo que o 20 de
novembro fosse comemorado como o "Dia da Consciência Negra", pois era
mais significativo para a comunidade negra brasileira do que o 13 de maio.
"Treze de maio traição, liberdade sem asas e fome sem pão", assim
definia Silveira o "Dia da Abolição da Escravatura" em um de seus
poemas. Em 1971 o 20 de novembro foi celebrado pela primeira vez. A idéia se
espalhou por outros movimentos sociais de luta contra a discriminação racial e,
no final dos anos 1970, já aparecia como proposta nacional do Movimento Negro
Unificado.
A
diversidade de formas de celebração do 20 de novembro permite ter uma dimensão
de como essa data tem propiciado congregar os mais diferentes grupos sociais.
"Os adeptos das diferentes religiões manifestam-se segundo a leitura de
sua cultura, para dali tirar elementos de rejeição à situação em que se
encontra grande parte da população afrodescendentes”.
Os
acadêmicos e os militantes celebram através dos instrumentos clássicos de
divulgação de ideias: simpósios, palestras, congressos e encontros; ou ainda a
partir de feiras de artesanatos, livros, ou outras modalidades de expressão
cultural.
Grande
parte da população envolvida celebra com samba, churrasco e muita
cerveja", conta o historiador Andrelino Campos, da Faculdade de Formação
de Professores, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
"É
importante que se conquiste o "Dia da Consciência Negra" como o dia
nacional de todos os brasileiros e brasileiras que lutam por uma sociedade de
fato democrática, igualitária, unindo toda a classe trabalhadora num projeto de
nação que contemple a diversidade engendrada no nosso processo histórico".
Para o
historiador Flávio Gomes, do Departamento de História da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, a escolha do 20 de novembro foi muito mais do que uma
simples oposição ao 13 de maio: "os movimentos sociais escolheram essa
data para mostrar o quanto o país está marcado por diferenças e discriminações
raciais. Foi também uma luta pela visibilidade do problema. Isso não é pouca
coisa, pois o tema do racismo sempre foi negado, dentro e fora do Brasil. Como
se não existisse".
O projeto
neoliberal implantado em nosso país acirra as desigualdades, afetando, ainda
mais, as parcelas menos favorecidas da população brasileira. Em pesquisa
realizada pelo DIEESE (1998) são apresentadas informações que comprovam a
discriminação à população negra, tomando por base as regiões metropolitanas.
Taxas de
Desemprego por Sexo e segundo a Raça
Os dados
apresentados demonstram que as taxas de desemprego entre homens e mulheres,
negros (as) e não negros (as) ainda registram valores muito elevados. Se
compararmos a diferença das taxas entre homens negros e não negros, com mulheres
negras e não negras, a maior diferença estará em relação às mulheres negras, já
que estas apresentam, em todas as regiões, as maiores taxas de desemprego.
No
entanto, este debate não se encerra na mera inserção no mercado de trabalho.
Deve ser acompanhado pelos números que registram a taxa de analfabetismo o
número de anos de permanência na escola e a média de rendimentos salariais.
Na
Síntese dos Indicadores Sociais - IBGE (2000) é apontado que, em 1999, a taxa
de analfabetismo entre pretos e pardos é de 20%, enquanto entre os brancos cai
para 8,3%. Quando demonstram o número de anos de permanência na escola as
estatísticas não são diferentes: os pretos passam 4,5 anos, os pardos 4,6 anos
e os brancos 6,7 anos. Isto demonstra que os pretos e pardos saem mais cedo da
escola, o que irá refletir, diretamente na população jovem, quanto ao acesso ao
nível superior e ao mercado de trabalho.
Quando
empregados (as) os níveis salariais também servem para denunciar a
discriminação econômica e de gênero. Conforme Sueli Carneiro e Thereza Santos,
na obra "Mulher Negra" : 83,1% das mulheres negras trabalham na
agricultura e na prestação de serviços (principalmente como empregadas
domésticas); 60% não têm registro em carteira. Quanto à média salarial, os
homens brancos recebem 6,3% salários mínimos (s.m), os negros 2,9 s.m, as
mulheres brancas 3,6 s.m e a s mulheres negras 1,7 s.m Tais dados tornam-se
ainda mais gritantes quando se estima que o número de mulheres chefes de
família no país varia entre 20% e 25%. As condições de trabalho e salários
destas mulheres refletiram diretamente no grau de pobreza dessas famílias.
O projeto
do Dia Estadual da consciência negra a ser comemorado em cada dia 20 de
novembro originou a Lei de n.º 12056 de 12 de janeiro de 1993, onde estabelece
que o Governo e a Assembleia legislativa promoverão atividades alusivas a esta
data. Ficou instituído também que as comemorações nas escolas públicas estarão
relacionadas a dedicação das atividades curriculares para abordagem de temas
relativos a participação do negro na história do Brasil.
Remeto-me,
nesse momento, a todos aqueles que lutam alguns chegando a dar a própria vida,
em nome da liberdade, da democracia e do respeito às diferenças. Dos povos
indígenas à Zumbi dos Palmares; dos negros (as) escravo (as) a Joaquim Nabuco,
de Chica da Silva aos poetas Cruz e Souza, Lima Barreto; de Castro Alves à
Jorge Amado; do Mestre Aleijadinho ao Geógrafo Milton Santos; de Chiquinha
Gonzaga aos guerrilheiros e guerrilheiras do Araguaia. Nesta data símbolo da
resistência saúdo a todos que lutam e lutaram na construção de um mundo justo e
igualitário.
Para a
socióloga Antônia Garcia, doutoranda do Instituto de Pesquisa e Planejamento
Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é importante que
se conquiste o "Dia da Consciência Negra" "como o dia nacional
de todos os brasileiros e brasileiras que lutam por uma sociedade de fato
democrática, igualitária, unindo toda a classe trabalhadora num projeto de
nação que contemple a diversidade engendrada no nosso processo histórico".
Referências bibliográficas:
ACDS –
Associação Cultural e Desportiva Samburá
DIEESE -
Reportagem da revista Com Ciência, editada pela Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência, SBPC
No Brasil colonial os negros reagiram à escravidão:- Evitando filhos
- Suicidando-se
- Matando feitores
- Fugindo pelos quilombos
Os castigos
A liberdade é própria do ser humano. Durante a historia da humanidade só foi possível manter a escravidão através de muita violência praticada contra os escravos. No Brasil, também foi assim.
Apesar de trabalharem de 14 a 16 horas diárias e de realizarem todas as tarefas necessárias à existência e ao funcionamento do engenho, os escravos eram castigados por qualquer falta cometida.
A cada falta correspondia um tipo de castigo. Por exemplo: o escravo que desobedecia ao feitor era punido com um chicote de couro cru chamado bacalhau.
Aquele que fugia era marcado na testa com um F(fujão), escrito com ferro em brasa. Quando o escravo marcado fugia pela segunda vez, cortavam-lhe uma orelha.
O começo
O comercio começou a ser feito pelos portugueses a partir de 1441. Conforme
esse negocio foi crescendo, essa tarefa passou a ser feita pelos azenegues,
homens de diversas cores e origens.Os negros capturados seguiam a pé, amarrados uns aos outros, até as feitorias que os comerciantes portugueses erguiam no litoral africano.
Uma grande parte deles foi trazida para o Brasil, o país que mais recebeu escravos da América.
A abolição da Escravatura
Dois conceitos históricos são entendidos por abolição da escravatura: o conjunto de manobras sociais e políticas empreendidas entre o período de 1870 à 1888 em prol da libertação dos escravos, e a própria promulgação da lei Áurea, assinada pela princesa Isabel em 13 de maio de 1888 promovendo a abolição do regime escravista.
Mas na verdade foi um movimento social e político ocorrido em 1870 e 1888 que defendia o fim da escravidão no Brasil. Terminada com a promulgação da lei Áurea, que extingue o regime escravista originário da colonização.
Movimento Abolicionista
O movimento abolicionista, especialmente a partir de 1870, formado por pessoas das cidades que não tinham muita necessidade de escravos e estavam antenadas com as ideias e noticias de fatos que chegavam da Europa e dos Estados Unidos.
Portanto o trabalho escravo só foi abolido no Brasil porque os interesses econômicos eram outros: necessitava-se de novos mercados consumidores e com a proibição do trafico negreiro pelos mares também contribuiu para que a escassez e o enriquecimento da mão-de-obra escrava que tornava inviável sua utilização.
A abolição da Escravidão no brasil
Até os meados do século XIX, a maioria dos trabalhadores brasileiros, eram formados de escravos africanos e afrodescendentes.
A partir de 1850, com a proibição do trafico negreiro e a entrada de imigrantes, o numero de cativos foi diminuindo até que a escravidão passou a ser proibida, em 1888.
O trabalho dos escravos, estava sendo substituído pelo trabalho livre nas fazendas do interior paulista.
Havia muitos fazendeiros que não queriam que a escravidão acabasse, e eles impediam qualquer grande investida abolicionista.
Em 1870 se desenvolve no país o chamado movimento abolicionista, formado por pessoas das cidades que não tinham muita necessidade de escravos e estavam “ligados” às idéias e noticias de fatos que chegavam da Europa e dos Eua.
Depois de 1850, o escravo passou a ser uma mercadoria bastante cara e preciosa. O senhor teve que adotar, em relação ao escravo uma postura diferente. Em conseqüência disso, surgem as primeiras leis protetoras em relação ao escravo.
O fim da escravidão
O fim da escravatura, porém não melhorou a condição social e econômica dos ex-escravos. Sem a formação escolar nem profissão definida, para a maioria deles, a simples emancipação Júndica não muda sua condição muito menos ajuda a promover sua cidadania ou ascensão social.
No dia 13 de maio de 1888, sem suportar tanta pressão, o Brasil declara “fim à escravidão”. Quem assina a lei Áurea é a princesa Isabel, já que D. Pedro II estava fora do Brasil. Agora o fim do império estava muito próximo. A escravidão, que sustentava o reinado, ia acabar sendo a principal responsável pelo seu fim.
A lei Áurea não é mais comemorada com a mesma
alegria de antigamente, nem mesmo pelos negros, principais beneficiados.
Participantes do movimento negro no Brasil consideram que foi apenas uma
conquista na área jurídica, pois obrigou o fim da escravidão, mas não houve
conquista social, os negros permaneceram marginalizados na sociedade e até hoje
lutam contra esse preconceito.
O preconceito
racial é o que mais se abrange em todo o mundo, pois as pessoas julgam as
demais por causa de sua cor, ou melhor, raça. Antigamente, era comum ver-se negros africanos
acompanhados de belas louras nórdicas ou de outras partes da Europa. Não
existia o menor preconceito entre esses casais nem em relação a eles. Para os
brasileiros, porém, era algo inédito e escandaloso; faziam-se piadas insinuando
que o sucesso dos negros se devia ao fato de que eram muito bem dotados
anatomicamente para o sexo. Uma visão preconceituosa típica, que procurava
desqualificar o negro e que escondia, às vezes, uma boa dose de inveja.
Os negros
e asiáticos que iam estudar na Europa, no entanto, possuíam uma cultura igual
ou superior a de qualquer estudante branco, uma vez que haviam frequentado boas
escolas em seus países, indo finalmente aprimorar seus estudos na Europa ou nos
Estados Unidos. Não havia nenhuma desigualdade que dificultasse uma estreita
convivência entre eles.
No
Brasil, pretende-se erradicar o preconceito racial ou racismo com leis. Só a educação poderá esclarecer a todos,
sobretudo aos brancos, o que representou para a raça negra o que lhe foi
imposto pelo tráfico escravista. A Igreja se julgava com o direito de catequizar
aqueles que nada sabiam da religião católica. O Governo nada fez, depois da
Abolição, para dar aos ex-escravos condições de estudar e conquistar um lugar
na sociedade. O Brasil está muito longe de ser um país onde todos sejam iguais.
O espaço e a visibilidade que o negro tem em nossa sociedade, não permitem que
ele sirva de referência. Estudos realizados pelo IBGE mostram que no Brasil os
brancos recebem salários superiores, cerca de 50%, aos recebidos pelos negros
no desempenho das mesmas funções, e que o índice de desemprego desses também é
maior. No campo da educação, o analfabetismo, a repetência, a evasão escolar
são consideravelmente mais acentuados para os negros.
No
Brasil, a porcentagem de quem se declara de cor Branca é maior, sendo eles 47,7
% e se destacando mais na região Sul de nosso país. Em seguida, vem a população
de cor Parda, com 43,13 % e com maior parte na região Norte. Depois, em
menoria, quem se declara de cor Preta é 7,61% da população, sofrem com o
preconceito racial e estão em maior parte na região Sudeste do Brasil.
Com tudo
isso, percebemos que o preconceito é um dos problemas mais graves em
todo o mundo, e que as pessoas precisam se conhecerem melhor, independente de
cor ou raça, sendo branco, preto, índio ou qualquer outro tipo, devemos
respeitar e zelar pelo próximo.
Autoria:
Rafael Pedretti
Introdução
Ao
falarmos em escravidão, é difícil não pensar nos portugueses, espanhóis e
ingleses que superlotavam os porões de seus navios de negros africanos,
colocando-os a venda de forma desumana e cruel por toda a região da América.
Sobre
este tema, é difícil não nos lembrarmos dos capitães-do-mato que perseguiam os
negros que haviam fugido no Brasil, dos Palmares, da Guerra de Secessão dos
Estados Unidos, da dedicação e ideias defendidas pelos abolicionistas, e de
muitos outros fatos ligados a este assunto.
Apesar de
todas estas citações, a escravidão é bem mais antiga do que o tráfico do povo
africano. Ela vem desde os primórdios de nossa historia, quando os povos
vencidos em batalhas eram escravizados por seus conquistadores. Podemos citar
como exemplo os hebreus, que foram vendidos como escravos desde os começos da
História.
Muitas
civilizações usaram e dependeram do trabalho escravo para a execução de tarefas
mais pesadas e rudimentares. Grécia e Roma foram umas delas, estas detinham um
grande numero de escravos; contudo, muitos de seus escravo eram bem tratados e
tiveram a chance de comprar sua liberdade.
Até o
século quinze, os europeus só tinham contato direto com o litoral Norte da
África. Mas, a partir de mil novecentos e quarenta e cinco, os navegadores
portugueses aprenderam a contornar todo o continente africano.
Depois os
portugueses, os holandeses, os ingleses, os espanhóis, os franceses e até os
dinamarqueses também enviaram seus navios para a costa africana.
Inicialmente,
os negócios europeus adquiriram marfim, pimenta e ouro. Depois quando teve
início a colonização da América, passaram a ter um grande e terrível interesse:
Obter escravos.
A
escravidão não era novidade na África. Desde o século onze os árabes adquiriram
escravos africanos. Mas os árabes tinham poucos escravos já eram quase livres.
De acordo com alguns historiadores, os europeus retiraram cerca de dez milhões
da África para levá-los a América!
Havia duas
maneiras de os comerciantes europeus obterem escravos africanos. O primeiro era
direto: Desembarcavam soldados que invadiam uma aldeia e capturaram seus
moradores. O segundo modo era indireto. Os povos africanos faziam guerras uns
contra os outros e vendiam os prisioneiro para os comerciantes europeus.
Algumas nações africanas chegaram a enriquecer atacando outras nações e
vendendo os habitantes aos traficantes de escravos árabes e europeus.
No
Brasil, a escravidão teve início porque os brancos tentaram obrigar os índios a
trabalhar nos engenhos de açúcar na primeira metade do século dezesseis. os
portugueses traziam os negros africanos de suas colônias na África para
utilizar como mão-de-obra escrava nos engenhos de açúcar do Nordeste. Os
comerciantes de escravos portugueses vendiam os africanos como se fossem
mercadorias aqui no Brasil. Os mais saudáveis chegavam a valer o dobro daqueles
mais fracos ou velhos.
Além
disso, nem a igreja nem a coroa se opuseram a essa escravização. A escravidão
dos negros era justificada pela sua preexistência na África. O negro era
considerado não civilizado e racional mente inferior. A lei protegia de certo
modo os índios, mas o escravo negro não tinha direito algum, e era
juridicamente considerado como coisa, e não como pessoa.
Depois de
aprisionados em guerras entre os diversos povos na África, os africanos eram
acorrentados e marcados com ferro em brasa, como forma de identificação. Então,
eram vendidos aos comerciantes europeus, americanos ou africanos que se
estabeleciam no litoral da África e vinha para a América nos navios negreiros.
Os navios
negreiros saiam da África com seiscentos escravos em média, embora esse numero
variasse de acordo com o tipo e o tamanho das embarcações. Receando as
possíveis revoltas dos africanos durante a viagem, os traficantes trancavam
eles nos porões dos negreiros.
A viagem
de Luanda (África) ate Recife (Brasil) durava geralmente trinta e cinco dias.
Até a Bahia, quarenta dias; até o Rio de Janeiro, cerca de dois meses.
Nos
escuros porões dos navios, o espaço era reduzido e o calor, quase insuportável.
Além disso, a água era suja e o alimento, insuficiente para todos.
Devido
aos maus tratos e as péssimas condições do transporte, calcula-se que morriam
de cinco a vinte e cinco por cento dos negros durante a viagem, sendo que os
corpos eram lançados ao mar. Por isto, os navios negreiros eram chamados de
“tumbeiros” (palavra referente a tumba) ou “túmulos flutuantes.
Supõe-se
que entre mil quinhentos e cinquenta e mil oitocentos e cinquenta e cinco,
cerca de quatro milhões de africanos foram trazidos para o Brasil.
Os
atritos entre colonos e jesuítas, pois os primeiros desejavam apenas escravizar
os índios, enquanto os segundos pretendiam educá-los e “convencê-los e
colaborar”. A catástrofe demográfica provocada pelo extermínio, e doenças
também influem para que a escravização indígena ficasse em segundo plano,
embora a prática só tenha sido oficialmente proibida em mil setecentos e cinquenta
e oito. A partir da década de mil quinhentos e cinquenta cresceu a importação
de africanos.
As
primeiras regiões do brasil a receberem escravos africanos foram Bahia e
Pernambuco, locais onde a produção de açúcar mais prosperou. Ao longo do século
dezessete, o tráfico de escravos chegou a dar mais lucro para a metrópole
portuguesa do que o próprio negocio de açúcar.
Nas
fazendas de açúcar ou nas minas de ouro (a partir do século dezoito), os
escravos eram tratados da pior forma possível. Trabalhavam muito (de sol à
sol), recebendo apenas trapos de roupa e alimentação de péssima qualidade.
Passavam as noites nas senzalas (galpões escuros, úmidos e com pouca higiene)
acorrentados para evitar fugas. Eram constantemente castigados fisicamente,
sendo que o açoite era a punição mais comum no Brasil Colônia.
Eram proibidos
de praticar sua religião de origem africana ou de realizar suas festas e
rituais africanos. Tinham que seguir a religião católica, imposta pelos
senhores de engenho, adotar a língua portuguesa na comunicação. Mesmo com
todas as imposições e restrições, não deixaram a cultura africana se apagar.
Escondidos, realizavam seus rituais, praticavam suas festas, mantiveram suas
representações artísticas e até desenvolveram uma forma de luta: a capoeira.
As
mulheres negras também sofreram muito com a escravidão, embora os senhores de
engenho utilizassem esta mão-de-obra, principalmente, para trabalhos
domésticos, cozinheiras, arrumadeiras e até mesmo amas de leite foram comuns
naquele tempo da colônia.
No Século
do Ouro (Dezoito) alguns escravos conseguiram comprar sua liberdade após
adquirirem a carta de alforria. Juntando alguns “trocados” durante toda a vida,
conseguiam tornar-se livres. Porém, as poucas oportunidades e o preconceito da sociedade acabavam fechando
as portas para estas pessoas.
O negro
também reagiu a escravidão, buscando uma vida digna. Foram comuns as revoltas
nas fazendas em que grupos de escravos fugiam, formando na floresta os famosos
quilombos. Estes, eram comunidades bem organizadas, onde imigrantes viviam em
liberdade, através de uma organização comunitária aos moldes do que existia na
África. Nos quilombos, podiam praticar sua cultura, falar sua língua e exercer
seus rituais religiosos. O mais famoso foi o Quilombo de Palmares, comandado
por Zumbi.
A partir
da metade do século dezenove a escravidão no brasil passou a ser contestada
pela Inglaterra. Interessada em ampliar seu mercado consumidor no brasil e no
mundo, o Parlamento Inglês aprovou a Lei Bill Aberdeen (mil oitocentos e
quarenta e cinco), que proibia o trafico de escravos, dando o poder os ingleses
de abordarem e aprisionarem navios de países que faziam esta prática.
Em mil
oitocentos e quarenta e cinco, o Brasil cedeu ás pressões inglesas e aprovou a
Lei Eusébio de Queiróz que acabou com o trafico negreiro. Em vinte oito de
setembro de mil oitocentos e setenta e um era aprovada a Lei do Ventre Livre
que dava liberdade aos filhos de escravos nascidos a partir daquela data. E no
ano de mil oitocentos e oitenta e cinco era promulgada a Lei dos Sexagenários
que garantia que garantia a liberdade aos escravos com mais de sessenta anos de
idade.
Somente
no final do século dezenove é que a escravidão foi mundialmente proibida. Aqui
no brasil sua abolição se deu em treze de maio de mil oitocentos e oitenta e
oito com a promulgação da Lei Áurea, feita pela Princesa
Isabel.
Bibliografia
COTRIM,
Gilberto. Saber e fazer História, 6ª série. São Paulo: Saraiva, 1999.
SCHMIDT,
Mario Furley. Nova História crítica. São Paulo: Nova Geração, 1999.
A situação do negro no Brasil
A identidade de um povo, num Estado nacional, pode se transformar, lentamente, seguindo as modificações históricas ou de forma mais veloz, sobretudo em períodos de guerra ou de grandes transformações locais ou mundiais. Muitas vezes tais mudanças são geradas durante certo tempo e, a partir de algum movimento, tornam-se visíveis.Assim sendo, para entender o presente, é preciso compreender o que a história significa no passado e para o futuro e, ainda, a diferença entre a história, os pontos de vista históricos e as interpretações da história.
O Estado brasileiro, escravista durante mais de trezentos anos, reestruturado por conceitos republicanos excludentes, impôs e estimulou, ao longo da história, conceitos de nacionalidade que determinaram um discurso cultural distante da realidade multi-cultural do país.
A cultura brasileira, essencialmente permeada por valores femininos, negros, caboclos, indígenas, definida por encontros e conflitos, foi mediada, durante anos, pelo discurso da democracia racial e sua manifestação material legitimada a partir de uma leitura política branca.
A rica diversidade da cultura dos povos de origem europeia aqui recriada, as africanidades brasileiras, as contribuições asiáticas, judias e árabes, as expressões indígenas resultantes dos conflitos da colonização, as características de nossa 'antropofagia', nossa identidade construída com referência em uma diversidade hierarquizada -, nem sempre essa dinâmica foi considerada pelo discurso que justifica e teme as desigualdades estruturais.
Começa, porém, a ser desenhada uma cultura de democracia participativa, que necessariamente inclui a cidadania cultural. O Brasil, Estado/nação, vive, neste momento, um período privilegiado no que diz respeito às possibilidades de concretizar transformações fundamentais abortadas em vários períodos da história. As profundas transformações dos conceitos de identidade nacional são então amparadas por uma política cultural inclusiva, que começa a se materializar valorizando a diversidade e desestruturando a hierarquia herdada da escravidão.
Espelho, espelho meu....
Em 1814, o governo geral do Rio de Janeiro recomenda ao governador da Bahia:
'Determina Sua Alteza Real que V. Exa. proíba absolutamente os ajuntamentos de Negros chamados vulgarmente batuques, não só de dia, mas muito particularmente de noite, pois ainda que se lhes permitisse isto para os fazer contentes não deve continuar esta espécie de divertimento, depois de terem abusado tanto dela.'
(Com o aumento das revoltas da escravos e de outros grupos pobres, principalmente a partir do fim do século XVIII, os batuques foram considerados focos de rebelião e esteticamente proibidos)
O Brasil tem a maior população negra fora da África e a segunda maior do planeta. A Nigéria, com uma população estimada de 85 milhões, é o único país do mundo com uma população negra maior que a brasileira.
Responsável pelo maior translado humano da história - entre 3,6 e 5 milhões de africanos foram importados para o Brasil, de várias partes do continente africano -, a escravidão gestou estruturas, relações sociais e econômicas, valores e conceitos, visão de mundo incluindo visão de Estado, que tinham por meta sua permanência, sobrevida e a manutenção dos privilégios resultantes.
Só a partir da década de 1930, com base, principalmente, nas teses sobre a miscigenação e na forma envergonhada de expressão do discurso racista, consolidou-se no país o mito da democracia racial. O que significa que, ainda durante a maior parte deste século, foram inibidas ações de combate ao racismo, a organização cultural e política dos negros brasileiros, e a implantação de políticas para a superação das desigualdades raciais. No período pós-Abolição, a ausência de um sistema legal explícito que definisse as desigualdades e, ainda, as africanidades visíveis da cultura brasileira, serviu como argumento para que o Estado e a sociedade desconsiderassem a necessidade de se criar mecanismos para a inclusão do povo negro no processo de desenvolvimento nacional.
A rica história invisível dos seres escravizados nos vários países africanos, sua recriação cultural, são apenas parte do ser cultural brasileiro. A polícia, a prática da medicina e das outras ciências, a cultura de produção rural e de utilização da terra, a política de imigração, o sistema político, os métodos utilizados para a sistematização dos dados, as relações de produção e de gerenciamento da riqueza, o regime de propriedade e de créditos, o sistema legal e o escolar, o mercado de trabalho, tudo foi estruturado para atender à necessidade de enriquecer os senhores, de controlar o escravo ou, depois, para consolidar e justificar as desigualdades.
Mais de trezentos anos de escravidão, do século XVI até o final do século XIX, como instituição legal, social e econômica, que determinou o estilo de vida do Brasil colônia, representam uma referência histórica fundamental para se compreender as desigualdades raciais no país, e o aprofundamento da hierarquização dos direitos e da própria definição de humanidade, de valor social da pessoa.
O escravo, para que a escravidão se justificasse, não era considerado um ser totalmente humano por nenhuma das instituições, inclusive pela igreja. As práticas culturais e religiosas, a visão de mundo desse conjunto humano foram sistematicamente desqualificadas, apesar de sua integração ao modo de ser nacional, após mais de trezentos anos de convivência cultural, e sendo a sua força de trabalho responsável pelo desenvolvimento da economia. A aparência física dos negros, exceto quando se tratava de servir sexualmente os senhores, foi associada à dos animais e esteticamente desagradável ou inferior. Seu corpo era para o trabalho e sua força utilizada corno a dos animais. A participação nas artes, extremamente relevante sobretudo no século XVIII, pouco ampliou os seus direitos, ou lhes assegurou o exercício da cidadania.
"Durante a escravidão, e mesmo após, as expressões religiosas negras foram descritas por escrivão de polícia a que narrava invasões de terreiros ou derrotas de revoltas, por autoridades eclesiásticas e civis preocupadas em combater a 'feitiçaria' e a subversão dos costumes..." -
João José Reis
Se o movimento abolicionista foi longo, heterogêneo e, por fim, vitorioso, a República surgiu como reação ao fim absoluto da escravidão, apesar do engajamento de lideranças negras no movimento republicano.
Várias peças religiosas tomadas dos 'pretos', africanos, e dos 'criolos', afro-brasileiros, ainda hoje estão nas delegacias, senão foram destruídas ou desapareceram.
Principalmente a partir da promoção, pelo Estado, da imigração europeia subvencionada para substituir a mão-de-obra negra, da criação de status superior de cidadania para os imigrantes recém-chegados em relação aos negros, das promessas do Estado de embranquecer a nação, da participação periférica dos afro-brasileiros no processo de industrialização, da fraca representatividade política, da desqualificação de suas referências culturais, estruturou-se o que pode ser chamado o sistema de exclusão racial informal.
O desejo, a quase que necessidade brasileira de ser uma democracia confundiu-se com o mito desmobilizador longamente cultivado.
Zumbi, mostra a tua cara !
Agora, no final de seu quarto de século, o país passa por profundas transformações. No início dos 1900, representantes do Estado e dos setores dirigentes prometia que este seria um país branco em cem anos, como forma de assegurar presença respeitável nos conclaves internacionais. As projeções para o V Centenário, os cenários desenhados para a o início do próximo milênio, mostram, entretanto, que a diversidade e a expressão afro-brasileira agregam valor ao Brasil no cenário mundial.
Mas, que processos culturais permitirão as imensas possibilidades humanas de valorizar suas diferenças? Que processos transformarão o imaginário social que manifesta perversamente o racismo envergonhado, e se justifica com a afirmação de que aqui não se pratica racismo como lá ... ?
Novas referências estão sendo construídas para que a política cultural inclua a riqueza material e imaterial gestada pelos africanos e seus descendentes brasileiros.
Os produtores e criadores negros, os intelectuais, movimentos militantes, todos têm papel relevante nesse processo, e têm sido considerados. Entretanto, ainda não é possível ter certeza da imagem real de Zumbi dos Palmares (enquanto são vários os desenhos que retratam Domingos Jorge Velho) para que, além de ocupar a galeria dos heróis, possamos ter sua foto estampada nas moedas nacionais. Ou ir além das caricaturas de Anastácia e Chica da Silva e, ainda, descobrir a história verdadeira do fim de Luiza Mahin, a mãe de Luiz Gama. Somente diretrizes e investimento político do Estado têm sido capazes de interferir na estrutura dinâmica cultural e de criar mecanismos distributivos para compensar as desigualdades históricas. Isso para que as mudanças não sejam cosméticas.
Cumprindo a agenda atrasada
O ano de 1995, tricentenário da morte de Zumbi dos Palmares, último líder da República de Palmares, quilombo criado em Alagoas, que durou cerca de cem anos e foi destruído em 1694 , foi um marco na relação negro - Estado e na cultura do Estado em relação ao negro.
Ao som dos tambores, que no dia 20 de novembro protestavam contra o que tem sido definido como apartheid sem leis, e respondendo às críticas e propostas do movimento social negro, o presidente da República, em um ato no Palácio do Planalto, falou abertamente sobre o racismo, criou o Grupo de Trabalho para a Valorização da População Negra e elegeu a cultura, nominalmente a Fundação Cultural Palmares, como uma das áreas de investimento imediato para iniciar as transformações.
Foi preciso o engajamento pessoal do chefe do Estado para romper a inércia e a tendência à desqualificação política do negro. Sabe o sociólogo Fernando Henrique Cardoso que por decreto não se muda o contexto social, mas que o círculo vicioso precisava ser rompido e que orçamentos, leis e programas refletem os conceitos culturais. Ainda não nomeava ali, porta-vozes confiáveis, intermediários como se costuma fazer - criava, isto sim, espaços de poder para elaboração de propostas e execução, que, embora ainda limitados, representavam um ponto de força na estrutura do governo.
A cultura sempre foi o espaço possível para o exercício da sensibilidade negra, embora essa participação não mudasse o lugar social de seus realizadores. Principalmente antes de a indústria controlar o setor, o talento era limitado pelas condições de vida. Além da matriz cultural brasileira, do imaginário e da visão de mundo serem expressões profundas da africanidade aqui recriada, a expressão através das artes é fundamental, mesmo que descontextualizada.
Programas, projetos, convênios, revisão de conceitos e de sua materialização em apoios e orçamentos estão sendo realizados de forma a se criar um ambiente que permita a realização das mudanças estruturais projetadas pelos abolicionistas, adequadas a este final de milênio.
As comunidades negras rurais organizadas em quilombos, importantes celeiros culturais por sua história, com prática coletiva de produção diversificada, relação harmônica com o meio ambiente, foram identificadas. Estão sendo demarcadas as suas terras e eles estão recebendo os seus títulos de posse. São territórios culturais, são territórios habitados pelas mesmas famílias por vezes há mais de trezentos anos, vulneráveis devido à ausência, até então, de sua inclusão nos projetos fundiários do governo. Suas populações estão sendo capacitadas para potencializar os recursos e programas pilotos específicos de educação e saúde estão sendo realizados.
Programas de apoio ao desenvolvimento de uma dramaturgia afro-brasileira e capacitação para a representação adequada desse grupo humano estão sendo realizados em todo o país. São requalificados técnicos em comunicação, roteiristas, atores, diretores, artistas gráficos, através de convênios de várias naturezas.
A invisibilidade, ou a exposição desqualificada dos negros e de sua cultura, eram motivo para a baixa autoestima, tanto dessa população quanto dos brasileiros em geral, na sua grande maioria afrodescendentes.
O mapa da produção cultural negra e de sua história urbana e rural está sendo organizado e já parcialmente disponibilizado através dos meios informatizados. A história hoje disponível apenas em acervos fechados ou de difícil acesso, também no exterior, às vezes fragmentada, está sendo organizada em um banco de dados que inclui toda a diversidade e inteligência negra brasileira. Peças religiosas estão sendo identificadas e devolvidas aos seus proprietários, quando não são doadas para o acervo. Sítios arqueológicos, como a serra da Barriga, e áreas de antigos quilombos estão sendo estudadas. A história da língua portuguesa no país, da perda das línguas de origem africana e da 'invenção' da língua que falamos em todo o território nacional, está sendo sistematizada. A vida de mulheres como Chica da Silva, Carolina de Jesus, Luiza Mahin; a competência e o desencanto político de abolicionistas como André Rebouças, Joaquim Nabuco e Luís Gama, que pensavam o desenvolvimento brasileiro; Machado de Assis; as irmandades; os terreiros e a ação dos seus líderes espirituais; a sensibilidade e o universo contraditório dos cientistas; os conceitos de produção diversificada, em oposição às plantations, desenvolvido por muitos quilombos; o trabalho sofisticado com metais - toda essa riqueza começa a estar disponível em várias linguagens para a nação que não conhece a trajetória ancestral de, no mínimo, quarenta e cinco por cento de sua população.
A projeção da cultura brasileira no exterior tem sido objeto de ações de difusão que se desdobram em promoção da imagem do país, valorizando o multiculturalismo e o intercâmbio cultural. A pluralidade nacional começa a ser adequadamente representada e a presença de artistas afro-brasileiros começa a ser mais diversificada no mercado.
O marco físico e, ao mesmo tempo simbólico, da nova postura do governo é a criação do Centro Nacional de Informação e Referência da Cultura Negra.
A compreensão de que a falta de informação mantém a população negras estagnada nos espaços sociais inferiores, por vezes indiferente a possibilidades transformadoras e, ainda, que os cidadãos de todas as origens precisam ter referências para que se orgulhem das nossas africanidades, levou o governo, através da Fundação Cultural Palmares, a desenvolver e a implantar tal projeto.
O Centro Nacional de Informação e Referência da Cultura Negra, cuja placa da pedra fundamental foi assinada pelos presidentes Nelson Mandela e Fernando Henrique Cardoso, será inaugurado no marco do V Centenário do Descobrimento do Brasil, na capital federal, com o objetivo de ampliar a capacidade de participação dos afro-brasileiros no processo de desenvolvimento humano, científico e tecnológico do país. O diálogo cultural com a África e com os países multirraciais ganha novo conteúdo a partir dessa iniciativa.
O reconhecimento da importância da cultura negra no dia-a-dia nacional e de suas dinâmicas positivas como modelo civilizatório tem se expandido. Sua essência musical, a capacidade desse coletivo de transformar condições adversas em fatores de desenvolvimento humano e alegria, sua estética rica em diversidade, sua religiosidade inclusiva, passam a ser percebidas no conjunto da nação como elementos positivos da nossa diversidade.
O sistema de valores culturais do Estado, ao incluir a história do negro, tem se transformado e exigido novas reflexões, novo vocabulário, o desenvolvimento de novos conceitos de cidadania e, sobretudo, o início de mais respeito por essas novas vozes num cenário que nunca foi representativo dessa pluralidade.
Os projetos apoiados pelo Fundo Nacional de Cultura, pelas leis do mecenato, para obras de conservação e preservação do patrimônio, têm, devido ao engajamento pessoal do ministro Francisco Weffort, mais e mais incluído o patrimônio afro-brasileiro. As ações nos Estados e municípios estão sendo estimuladas a considerar a diversidade local. Dirigentes locais começam a perceber que o patrimônio criado pelos negros gera recursos e visibilidade para suas unidades administrativas e que, portanto, os produtores de tal riqueza devem ser considerados.
Política multicultural
A nova política cultural brasileira cria imensas possibilidades e muitas demandas para o Estado e para a sociedade.
O mercado foi motivado, surgiram e foram ampliadas várias publicações destinadas ao público negro. Uma nova estética, mais inclusiva, começa a ser visível na moda. A comunicação, inicialmente a oficial e agora, lentamente, a comercial, começa a tratar o negro como pessoa e a incluir imagens de seres humanos dos vários grupos étnicos.
0 mercado cultural, entretanto, continua excludente e o financiamento a produções negras muito tímidas. Há ainda uma imensa distância entre o discurso cultural e a prática da inclusão. Os produtos do teatro, da música, da dança, da literatura, do cinema, da televisão e da pintura, apresentados no cotidiano, estão longe de refletir a dinâmica social. Os produtores, com referência nos conceitos criados pelo mito da democracia racial, tratam o negro como segmento, de forma descontextualizada e eventual.
Por sua vez, os movimentos negros, que motivaram com seu ativismo histórico as mudanças atuais, têm sido parceiros críticos do Estado e começam a atuar junto a outros setores para aprofundar as transformações e para garantir que a agenda do governo seja agilizada. A descrença nas instituições e a indiferença em relação à representação política começam a serem transformadas no conjunto da população.
Nota-se uma profunda transformação em curso na identidade nacional. A compreensão das africanidades, aqui recriadas como parte do ethos brasileiro, muda as referências e rompe as limitações impostas por um falso euro centrismo e põe por terra os conceitos de raça e de fragmentação da diversidade. A inclusão valorizada do negro desmobiliza a necessidade de se provar que o diferente é melhor ou pior, além de permitir trocas mais profundas e prazerosas entre os humanos de várias origens.
Entretanto, como os valores do Estado só se transformam através de leis, programas e políticas, estão sendo organizados dados sobre o resultado dos investimentos planejados para o período de 1994 a 1999, a fim de que o próximo plano plurianual inclua metas específicas para a criação de um novo cenário, até o início da próxima década.
A obra civilizatória brasileira - a possibilidade do privilégio do encontro superar as marcas da perversidade e as agruras do caminho percorrido -, começa a ser esculpida ao som dos tambores, com a sabedoria das negras velhas e a elegância da capoeira.
Não vos alerto por represália
Nem cobro meus direitos por vingança.
Só quero
Banir de nossos peitos
Esta goma hereditária e triste
Que muito me magoa
E tanto te envergonha.
Autoria: Rodrigo Almeida
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